A matéria será enviada à sanção presidencial
Fonte.: Portal da Câmara dos Deputados / Reportagem – Eduardo Piovesan / Edição – Geórgia Moraes
Após analisar 28 emendas do Senado, a Câmara dos Deputados concluiu a votação da Medida Provisória 1031/21, que viabiliza a desestatização da Eletrobras, estatal vinculada ao Ministério de Minas e Energia que responde por 30% da energia gerada no País. A matéria perde a vigência amanhã e será enviada à sanção presidencial.
O modelo prevê a emissão de novas ações a serem vendidas no mercado sem a participação da empresa, resultando na perda do controle acionário de voto mantido atualmente pela União.
Essa forma de desestatização é a mesma proposta no PL 5877/19, que o governo enviou em 2019 mas não foi adiante. Apesar de perder o controle, a União terá uma ação de classe especial (golden share) que lhe garante poder de veto em decisões da assembleia de acionistas a fim de evitar que algum deles ou um grupo de vários detenha mais de 10% do capital votante da Eletrobras.
De acordo com o texto aprovado, do deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), esse tipo de mecanismo poderá ser usado para a desestatização de outras empresas públicas. “O processo vai permitir recuperar a capacidade de investimento da Eletrobras”, afirmou.
No mesmo artigo que trata da operação de capitalização, foram colocados dispositivos que preveem a contratação de energia de reserva de termelétricas movidas a gás natural, mesmo em regiões ainda não abastecidas por gasoduto.
Pendente de gasoduto
Os 1000 MW a serem comprados em 2026 devem privilegiar o consumo de gás natural produzido na região Amazônica e usados por termelétricas em capitais ou regiões metropolitanas ainda sem gás natural. Em 2027, outros 2000 MW deverão vir das regiões Nordeste e Norte, também com gás nacional e de duas capitais ou regiões metropolitanas de estados que não possuam gasoduto.
Em 2028, os 3 mil MW leiloados deverão vir preferencialmente das regiões Centro-Oeste (2,5 mil MW) e Norte (500 MW) de cidades ainda não abastecidas com gás natural.
Os leilões de 2029 e de 2030 deverão ser distribuídos para estados com suprimento de gás natural (1250 MW) e para cidades do Sudeste (750 MW) ainda sem gasoduto e na área da Sudene (Minas Gerais e Espírito Santo). Os contratos serão por 15 anos.
Questões trabalhistas
Duas emendas aprovadas tratam de questões trabalhistas. Uma delas limita a 1% das ações remanescentes da Eletrobras em poder da União o lote que poderá ser comprado pelos empregados da empresa e de suas subsidiárias em virtude de demissão após a desestatização. A opção pela compra de ações com o dinheiro da rescisão trabalhista deverá ser feita em até 6 meses da demissão e o preço da ação a ser vendida seria aquele de cinco dias antes da edição da MP (em fevereiro deste ano).
Em vez de ser facultativo, como no texto da Câmara, a redação que irá à sanção determina ao Poder Executivo contratar os empregados da Eletrobras demitidos sem justa causa nos 12 meses seguintes à desestatização em empresas públicas federais para cargos de mesma natureza e com salários equivalentes aos anteriormente recebidos.
Terras indígenas
Os deputados aprovaram ainda emenda para permitir o começo das obras do Linhão de Tucuruí depois de concluído e entregue aos indígenas o Plano Básico Ambiental-Componente Indígena (PBA-CI), elaborado pela Funai como parte do licenciamento ambiental. O documento já foi entregue e está sendo analisado pelos conselhos indígenas.
A linha de transmissão passará por 123 Km de terras dos Waimiri-Atroari para interligar Roraima ao Sistema Interligado Nacional (SIN).
Garantias
Mesmo após a capitalização, as garantias concedidas pela União à Eletrobras e a suas subsidiárias continuarão valendo para os contratos firmados anteriormente.
Nesse sentido, emenda aprovada determina que a Eletrobras desestatizada deverá manter as garantias oferecidas a terceiros em contratos anteriores à capitalização, repassando a garantia da União.
Eletronuclear e Itaipu
O texto autoriza o governo federal a criar uma empresa pública ou sociedade de economia mista para administrar a Eletronuclear, que controla as usinas de Angra, e a Itaipu Binacional, administrada conjuntamente por Brasil e Paraguai. Por questões constitucionais, ambas devem ficar sob controle da União.
Essa empresa também fará a administração da conta do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), poderá se associar ao Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), manterá os direitos e obrigações do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfra) e deverá gerir os contratos de financiamento que utilizaram recursos da Reserva Global de Reversão (RGR) celebrados quando a Eletrobras era responsável por essa reserva.
Em cinco anos a nova empresa reembolsará a RGR com os pagamentos dos mutuários referentes à amortização, taxa de juros contratual e taxa de reserva de crédito.
Dinheiro de Itaipu
Segundo o texto do relator, após a quitação, em 2023, das dívidas de Itaipu, os recursos da empresa que sobrarem e couberem ao Brasil serão repartidas da seguinte forma:
até 2032, 75% irão para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e 25% para financiar programa de transferência de renda do governo federal;
de 2033 em diante, a CDE ficará com 50% dos lucros adicionais de Itaipu, o programa de renda ficará com os mesmos 25% e os outros 25% ficarão com a nova estatal para executar as obrigações de revitalização de rios e geração de energia no Norte.
Adicionalmente, recursos dos fundos de energia do Sudeste e do Centro-Oeste (Fesc) e do Nordeste (Fen) não comprometidos com projetos contratados até 23 de fevereiro de 2021 deverão ser revertidos à CDE para modicidade tarifária.
A CDE é uma espécie de fundo sustentado com encargos depositados pelas empresas do setor e repassados em parte ao consumidor final. É usada para financiar energia de fontes alternativas, pagar o combustível usado na geração de energia na região Norte a fim de diminuir o valor da tarifa, universalizar a distribuição da energia elétrica e outras finalidades.
Descontos
Com o novo modelo será concedido prazo de exploração de 30 anos para as usinas do grupo, incluindo aquelas cujo prazo já tenha sido prorrogado pela Lei 12.783/13, no governo Dilma, para Tucuruí, Itumbiara, Sobradinho e Mascarenhas de Moraes. Mas o prazo começa a contar da assinatura dos novos contratos.
Estimativa do governo com a desestatização gira em torno de R$ 100 bilhões pelo novo prazo de outorga, mas do total que a empresa terá de pagar, a ser definido pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), deverão ser deduzidos o custo da mudança do regime de exploração de cotas para produção independente, o custo com o saneamento da empresa para a desestatização e também os valores de:
R$ 3,5 bilhões para reembolsar gastos com combustíveis de distribuidoras privatizadas e antes sob controle da estatal na região Norte;
R$ 3,5 bilhões divididos em 10 anos para a revitalização do rio São Francisco e do rio Parnaíba;
R$ 2,95 bilhões divididos em 10 anos para a redução dos custos de geração de energia na Amazônia Legal e para prover a navegabilidade no rio Madeira e no rio Tocantins;
R$ 2,3 bilhões divididos em 10 anos para projetos nas bacias das usinas de Furnas;
venda de energia a preço fixo para o Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF); e de contribuições por seis anos ao Cepel
Do que sobrar para ser pago pelo novo período de contrato, metade será na forma de bônus pela outorga adicional. A outra metade deverá ser direcionada, ao longo do período de concessão, à CDE na forma de contribuição anual.
O relatório determina que o dinheiro destinado à CDE deverá ser alocado como crédito para as distribuidoras na mesma proporção da diminuição da energia descontratada pela Eletrobras junto a elas em razão de sua saída do sistema de cotas.
A intenção é manter a modicidade tarifária porque, após a desestatização, a Eletrobras poderá vender energia no mercado livre, diminuindo a oferta de cotas no mercado regulado (residências, comércios e pequenas indústrias), levando a aumento do preço médio.
Por outro lado, o texto determina que a empresa desestatizada mantenha os contratos diretos com o consumidor final (grandes indústrias) previstos nas leis 11.943/09 e 13.182/15.