27 maio 2020

Decisão do STF pode reduzir ICMS a consumidor de energia

Grandes consumidores estão atentos aos efeitos de uma decisão do Supremo relacionada ao imposto incidente sobre a demanda de energia

Fonte.: Valor Econômico / Por Letícia Fucuchima — De São Paulo

Grandes consumidores de energia elétrica estão atentos aos efeitos de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) relacionada ao ICMS incidente sobre a demanda de energia. Embora ainda restem dúvidas sobre a tese firmada, entende-se que ela poderá trazer alívio fiscal num momento em que grande parte das empresas teve suas operações prejudicadas pela crise.

No fim de abril, o STF decidiu que a “demanda contratada”, ou “demanda de potência”, não deve estar incluída na base de cálculo do ICMS. Considerou-se que a demanda é o uso do fio, da infraestrutura: é uma reserva de potência, contratada para atender picos de energia, e difere do conceito de “consumo” de energia. Como não há consumo ou circulação de energia (mercadoria) nessa relação, não deve haver incidência de ICMS, diz a tese.

O tema é alvo de um debate enorme no setor elétrico, e chegou nos tribunais superiores há pelo menos dez anos. A tese tem repercussão geral, ou seja, será usado como regra para outros casos. Com isso, várias ações que estavam paralisadas na Justiça devem ter agora um desfecho seguindo a tese do Supremo.

Não há como medir exatamente o impacto financeiro dessa decisão, mas os valores envolvidos nas ações já em curso são relevantes, avalia Aline Bagesteiro, diretora jurídica da Abrace, associação que reúne mais de 50 grupos empresariais responsáveis por quase 40% do consumo industrial de energia elétrica do país. “Muitos dos nossos associados possuem ações, e várias outras empresas não tão grandes, de médio ou pequeno porte, também”, diz.

Mariana Amim, assessora jurídica da Anace (associação de consumidores de energia), afirma que a decisão é relevante e pode, inclusive, facilitar as negociações abertas pelos grandes consumidores sobre a demanda contratada durante a pandemia. “Não provocarei nenhuma perda tributária ao estado se pagar pelo consumo efetivo e negociar a demanda contratada, é um argumento que afasta dúvida sobre uma evasão fiscal”, afirma.

Ainda segundo Mariana, enquanto as leis estaduais não incorporarem o entendimento do STF, a tendência é que as empresas busquem a Justiça para pedir devolução do que foi pago aos cofres estaduais ou para corrigir a cobrança do tributo em suas contas daqui para frente. Ela observa que apenas São Paulo já tem uma lei excluindo o ICMS sobre a demanda de potência não utilizada, seguindo o entendimento que havia sido pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre esse assunto.

“É uma orientação para outros tribunais, vincula o judiciário, mas não a administração. O mais adequado seria que os estados reformassem as leis atuais, reconhecendo obediência à decisão”, afirma Leonardo Martins, sócio da área tributária do Machado Meyer. Porém, como isso não é uma praxe, ele entende que as empresas devem se sentir estimuladas a entrar na Justiça para discutir a questão, por já saberem o resultado da ação.

Douglas Mota, sócio de tributário do Demarest, entende que a decisão do STF ainda não resolveu completamente o tema. Em sua interpretação, não ficou claro se a exclusão da cobrança de ICMS serve para a totalidade da demanda contratada, ou apenas para o que não foi utilizado pelo consumidor, como já entendia o STJ. “Isso pode ser solucionado nos embargos de declaração”.

Segundo Giácomo Paro, sócio de tributário do Souto Correa Advogados, estuda-se agora se o racional empregado pelo STF poderia servir também para discussões semelhantes, como a da incidência de ICMS sobre as tarifas de uso de sistema TUST (transmissão) e TUSD (distribuição).