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29 jul 2020

Calendário político dificulta esperada reforma do setor elétrico, diz consultoria

Fonte.: Agência Reuters / Por Luciano Costa

Um calendário político pressionado por eleições municipais neste ano e discussões sobre temas como a pandemia de coronavírus e a proposta do governo de reforma tributária devem adiar decisões sobre uma muito discutida reforma do setor elétrico no Brasil, disse à Reuters uma consultoria que segue o tema no Congresso.

O movimento para revisão da regulamentação da indústria de eletricidade, que visa uma liberalização do mercado, começou ainda no governo anterior, sob Michel Temer, e tem sido levado adiante na gestão Bolsonaro, constando da lista de propostas priorizadas pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Mas uma agenda já carregada do governo junto ao Legislativo neste ano e a falta de consenso sobre alguns pontos das complexas mudanças propostas para o setor de energia tornam pouco provável uma aprovação final do texto ainda em 2020.

“Nossa visão é de que tem muita pauta acontecendo e ainda as eleições municipais por trás, sem contar as dificuldades de articulação do governo… é uma reforma muito complexa, a do setor elétrico tem diversos pontos que não são consenso, que precisam ser ajustados, então ela não deve passar esse ano”, disse o consultor Leon Rangel, da BMJ Consultores Associados.

Para a consultoria, criada pelo ex-ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, um projeto de lei sobre a reforma que tramita hoje no Senado deve ser apreciado pelo Plenário da Câmara dos Deputados apenas em 2021.

“A gente acha que a reforma tributária vai seguir o modelo da reforma da Previdência, no sentido de ‘tragar’ o Plenário para o entorno dela. Quando você vai entrar na discussão do setor elétrico, perde um pouco da força do debate. Ela está na lista de prioridades, mas não está, digamos, no imaginário popular, então para um ano eleitoral é complicado”, acrescentou Rangel.

O projeto da reforma (PLS 232/16) prevê uma gradual redução de exigências para que consumidores e empresas atuem no chamado mercado livre de energia, no qual podem negociar contratos de suprimento e preços diretamente com geradores e comercializadoras.

Pelo texto, o governo teria cerca de quatro anos para apresentar plano prevendo que todos consumidores, inclusive residenciais, possam negociar livremente sua energia, ao invés de terem distribuidoras obrigatoriamente como único fornecedor, como ocorre atualmente.

A reforma também tem mecanismos que visam acabar gradualmente com alguns subsídios que pesam sobre as tarifas de energia, incluindo descontos em tarifas de transmissão hoje garantidos para projetos de geração renovável, como usinas eólicas e solares.

TRAMITAÇÂO TRAVA

A Comissão de Infraestrutura do Senado aprovou o projeto de reforma do setor elétrico em março, e havia então expectativa de que o texto fosse para votação no Plenário da Câmara dos Deputados.

Mas um recurso apresentado pelo senador Jean Paul Prates (PT-RN) e assinado por outros 11 senadores pediu que a matéria passe pelo Plenário da Casa antes de ser enviada aos deputados.

Além disso, o Ministério de Minas e Energia sinalizou que pretende retomar esforços para aprovar no Congresso ainda neste ano uma proposta de privatização da Eletrobras, maior elétrica do Brasil.

A discussão sobre o destino da estatal, no entanto, é mais polêmica e concentra atenções, e deverá retirar foco da reforma regulatória, disse Rangel, da BMJ.

“O governo já provou que em linhas gerais ele não consegue negociar diversas pautas ao mesmo tempo. Se ele for priorizar mesmo a Eletrobras, como tudo indica, isso rouba articulação do restante, da reforma do setor”, afirmou.

As discussões sobre as mudanças propostas para o setor elétrico tiveram início ainda em 2016, no início da gestão Michel Temer, após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.

Secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia à época, o hoje presidente da associação Abrace, Paulo Pedrosa, que representa indústrias com grande consumo de energia, disse que a reforma enfrenta oposição de alguns segmentos do setor elétrico que se beneficiam das regras atuais.

“A reforma é muito necessária, e justamente por isso ela é tão combatida. Há movimentos dentro da cadeia de energia que trabalham para conseguir todo tipo de benefício —rentabilidade elevada, reserva de mercado, proteção, subsídio, e isso vem se acumulando”, disse ele à Reuters.

A consultoria política Metapolítica também apontou em levantamento recente que vê como “baixa” a possibilidade de deliberação no curto prazo sobre a proposta de reforma do setor elétrico.