10 jun 2021

Capitalização da Eletrobras deve levantar R$ 25 bilhões, diz Limp

Presidente fala em programa de demissões voluntárias e aporte em nova estatal

 Fonte.:  Valor Econômico /  Gabriela Ruddy, Rafael Bitencourt e Daniel Rittner

A capitalização da Eletrobras deverá ocorrer no primeiro bimestre de 2022 e levantar recursos privados da ordem de R$ 25 bilhões, disse ontem o presidente da estatal, Rodrigo Limp, em sua primeira entrevista no cargo.

Segundo o executivo, a projeção leva em conta o que a Eletrobras precisará pagar ao Tesouro Nacional, como bônus de outorga pelos novos contratos de concessão das suas usinas hidrelétricas. Ele ponderou, no entanto, que o valor final da operação ainda depende de estudos tocados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e pela própria empresa.

“A questão da bonificação da outorga é um parâmetro que foi considerado, mas há outro, que é a premissa de que a operação tenha tamanho suficiente para que a União tenha seu controle reduzido a menos da metade. Caso não seja suficiente, ainda é prevista a possibilidade de alienação de ações da União, mas esse não é o cenário mais provável”, afirmou ao Valor.

Presidente da Eletrobras avalia que haverá condições de conter o risco de desabastecimento

Além da outorga, a “nova” Eletrobras terá que assumir outras despesas financeiras no futuro, como contribuições anuais à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) para amenizar as tarifas de energia e desembolsos de quase R$ 9 bilhões em ações como recuperação de bacias hidrográficas, nos próximos dez anos.

De acordo com ele, a expectativa é que a oferta subsequente de ações (“follow on”) da companhia ocorra entre janeiro e fevereiro. Isso está condicionado à aprovação da MP 1.031, medida provisória que autoriza a privatização da Eletrobras, em reta final de discussão no Senado. Hoje, a União tem uma participação de 62% na estatal do setor elétrico, que deve ser   reduzida   para   cerca   de   45%   depois   da   capitalização. Na entrevista, Limp antecipou que a Eletrobras pretende fazer uma nova rodada do plano de demissão consensual (PDC) em 2021. Os PDCs vêm sendo implementados como parte de seu processo de reestruturação, nos últimos anos, em uma tentativa de deixar a companhia mais bem preparada para a transferência do controle à iniciativa privada.

Em março de 2021, a Eletrobras tinha 12.088 funcionários, frente aos quase 25 mil de antes da reestruturação. Em outubro, com essa nova rodada de desligamentos, a previsão é chegar a um número de 11.612 empregados.

“Estamos muito próximos do número de funcionários que consideramos ideal para a empresa. A grande redução de custos com pessoal já ocorreu”, disse. Em seguida, Limp lembrou que a companhia poderá aumentar novamente o quadro de pessoal no futuro, com o crescimento pós-privatização. “Temos a necessidade de rejuvenescer o quadro, que hoje tem uma faixa etária elevada.”

Empossado no início de maio, já com a MP 1.031 tramitando na Câmara dos Deputados, Limp vê uma Eletrobras pós-capitalização mais atuante no mercado livre de energia. “Vai ser uma empresa mais competitiva, mais dinâmica, mais aderente às transformações que estão acontecendo. O setor elétrico do futuro tem muito foco no mercado livre, que já é a grande fronteira de expansão, com quase 70% dos empreendimentos de geração sendo construídos.”

Sem apetite para entrar na briga causada pela inclusão de emendas “jabutis” na medida provisória, como a exigência de contratação de usinas térmicas e a prorrogação dos contratos com subsídios do Proinfa (programa de incentivos às fontes renováveis de energia), Limp evitou comentários detalhados sobre a fase final de tramitação no Congresso.

Ele deixou claro, porém, que uma eventual perda de vigência da MP 1.031 terá reflexos para a Eletrobras. No plano de longo prazo da companhia (2020-2035), ela prevê investir em torno de R$ 200 bilhões em ativos de geração e transmissão no período, caso seja capitalizada. Sem novos aportes dos acionistas privados, o investimento cai para uns R$ 95 bilhões.

Antes de privatizar a companhia, o governo precisará segregar a Eletronuclear e Itaipu Binacional, que vão ser reunidas em uma nova estatal. Essa empresa, que ficará com o controle das usinas nucleares em atividade (Angra 1 e 2) e em construção (Angra 3), ainda não tem nome. O orçamento da União para 2021 reserva R$ 4 bilhões para constituí-la.

Limp afirmou que a Eletrobras deverá tornar-se sócia minoritária, mediante aporte de recursos, na nova estatal. “Na segregação, que não está com modelo definido, o que estamos considerando hoje como possibilidade é que a Eletrobras, mesmo não sendo a controladora da Eletronuclear com essa nova empresa, muito provavelmente poderia continuar como uma sócia, mas uma sócia minoritária dessa empresa.”

Consultor legislativo da Câmara, Limp foi um dos técnicos mais empenhados no primeiro projeto de lei que tratava da privatização da Eletrobras, formulado pelo governo Michel Temer e então sob relatoria do ex-deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA). Depois, ele foi indicado para a diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). De lá, passou pouco mais de um ano como secretário de Energia Elétrica no Ministério de Minas e Energia, onde lidou com o princípio da atual crise hídrica.

Sobre isso, Limp disse que a Eletrobras tem dado sua contribuição para ajudar o país a enfrentar o atual quadro de escassez de chuvas. De acordo com ele, isso ocorre com o esforço de manter a “máxima disponibilidade” dos ativos em operação.

“Estamos reunindo todos os esforços possíveis para manter a máxima disponibilidade possível do nosso parque gerador, não só hídrico como nuclear, o que é fundamental para esse momento”, afirmou. Segundo o executivo, esse esforço também se estende às linhas de transmissão. “Estamos evoluindo cada vez mais na disponibilidade das instalações de transmissão. No ano de 2020, foi o nosso melhor ano.”

Ele lembrou que as redes de transmissão contribuem para aumentar a segurança energética, especialmente nas transferências de energia entre diferentes regiões. “A maior crise hídrica está acontecendo no Sudeste e no Centro-Oeste. Tivemos momentos em que o Nordeste não conseguia exportar toda a energia possível, por causa de restrições na transmissão. Manter a máxima disponibilidade dos ativos é fundamental.” O presidente da Eletrobras avalia que haverá condições de conter o risco de desabastecimento. “Este é um ano, de fato, muito crítico em termos de regime hidrológico, mas vejo o governo muito bem estruturado para enfrentar”, disse.